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Ilustradora Ing Lee lança webcomic para questionar inteligência artificial

“The Demons in AI’s Data” foi feito em parceria com o jornalista Carl Smith

A ilustradora coreana-brasileira Ing Lee divulgou nesta semana o seu mais recente trabalho, a webcomic The Demons in AI’s Data. A obra, disponibilizada gratuitamente (leia aqui), foi escrita pelo jornalista científico Carl Smith e questiona a inteligência artificial e seus impactos reais em todas as partes de nossas vidas.

“Carl encontrou meu trabalho e propôs que desenvolvéssemos a webcomic para seu projeto que seria desenvolvido durante a fellowship do programa MIP.labor, focado em comunicação científica sobre ciência de dados”, contou Ing Lee ao Portal Sarangbang. “Como uma forma de tornar mais acessível a pesquisa que Carl esteve desenvolvendo enquanto jornalista científico, ele pensou em desenvolver uma HQ sob um formato interativo, similar a um webtoon, mas com transições que aconteceriam ao ‘scrollar’ a tela, que foram programadas pelo desenvolvedor Stefan Auerbach.

A artista contou ainda sobre o processo criativo do quadrinho: “Apesar de eu já ter feito webcomics antes, nunca tinha feito algo neste formato. Então foi bem interessante de se pensar como se dariam essas transições e gerar um pacing vertical, diferente de clicar para passar a imagem como num mosaico no Instagram ou um virar de página de um quadrinho impresso tradicionalmente. (…) Eu gosto bastante dos filmes do Mamoru Hosoda, como ‘Summer Wars’ e ‘Digimon: O Filme’, e foram uma fonte de grande inspiração para cenas de hacking e metaverso”, contou.

O projeto é baseado em entrevistas com especialistas e teve participação também do professor Didar Zowghi, que trabalha com diversidade e inclusão na inteligência artificial na CSIRO, na Austrália — país onde a webcomic é ambientada, aliás. “O roteirista até me ajudou dando algumas direções de ruas reais e até mesmo a antiga casa na mesma região onde ele já morou que poderiam ajudar como inspiração”, afirmou Lee, que fez um estudo sobre plantas e arquitetura dos subúrbios de Sydney para os cenários da obra. “Apesar de nunca ter visitado o país, ter feito todos esses estudos sobre o local me dão a sensação de que, se eu visitar Sydney algum dia, vou sentir uma familiaridade estranha com esses lugares que retratei na HQ”, completou.

Acerca das discussões sobre inteligência artificial, a ilustradora falou um pouco do tema sob sua perspectiva enquanto parte de uma classe que sofre diariamente os impactos da tecnologia: “Há a falácia de que a inteligência artificial veio para ficar e que somos ludistas por nos recusar a fazer uso dela, como se estivéssemos negando um progresso ou o surgimento de uma nova técnica criativa tal qual como ocorreu com o debate da fotografia versus pintura realista, mas discordo veementemente. O debate é muito mais complexo e profundo do que isso, afirma Lee. “A IA do jeito que ela existe atualmente só funciona porque ela é alimentada por bancos de dados e, no caso da arte, de obras de artistas que em sua maioria jamais consentiram em ter seus trabalhos utilizados para treinar a IA generativa. Isso por si só já configura um plágio em massa e desafia todos os marcos conquistados até hoje em termos de direito autoral, sendo um imenso passo atrás no que tange à salubridade do trabalho artístico, reduzindo-o somente ao resultado e ignorando seu processo criativo.”

A artista relembrou ainda a recente e polêmica trend do Studio Ghibli, onde milhares de pessoas recriaram através do ChatGPT imagens no estilo do estúdio de animação japonês que criou filmes como A Viagem de Chihiro (2003) e Meu Amigo Totoro (1988). A controvérsia teve o seu auge quando o perfil oficial da Casa Branca no X (ex-Twitter) utilizou a trend para ironizar a prisão de uma imigrante dominicana.

Hayao Miyazaki sempre foi um artista bastante vocal contra esse tipo de tecnologia e não foi por coincidência que suas obras foram usurpadas para esse tipo de fim — é literalmente uma provocação e afronta ao seu legado. Seus filmes que, para qualquer bom entendedor, possuem um forte teor ambientalista e anti-guerra, foram corrompidos e reduzidos a uma imagem de deportação de imigrantes publicada pelo perfil oficial da Casa Branca no X/ex-Twitter. É grotesco e desrespeitoso num nível absurdo, e ver um artista tão grande como o Miyazaki sofrer um ataque desse tipo diz muito sobre a vulnerabilidade que a classe artística se encontra neste momento”, afirmou Lee. “O debate não é sobre usar ou não usar, e sim sobre ética, meio-ambiente e direitos humanos”, finalizou.

The Demons in AI’s Data, além de poder ser lida pelo link https://miplabor.de/DodgyData/chapterone.html, também está livre para uso como material educativo ou para ser republicada com os devidos créditos.

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